domingo, 2 de outubro de 2011

CONTO 0004 : LER E CRER - HORÓSCOPO.

Ele acordou atrasado, enfiou-se rapidamente embaixo do chuveiro, tomou banho, escovou os dentes e saiu dando o nó na gravata. Pôs a água na cafeteira e enquanto esperava sentou-se na cadeira da cozinha. Pegou o jornal, abrindo na página de horóscopo e leu o seu :
" Dia de muitas surpresas e muita sorte, fique atento e não deixe passara as oportunidades que surgirão, pois além  de muita sorte, o sol, que entra na sua casa astral lhe garante a possibilidade de encontrar sua tão esperada alma gêmea." 
Ele acreditou no que lerá, e levantou-se enchendo uma xícara de café e após  dar alguns goles, saiu apressado...
Faltavam poucos passos para atravessar a rua e chegar ao ponto quando o ônibus passou. Olhou no relógio, o próximo ônibus viria dali há meia hora... Pensando ainda no que dizia seu horóscopo, tranquilizou pensando que certamente seu chefe entenderia seu atraso... Quando finalmente sentou-se no ponto a espera do outro ônibus, viu que alguém havia esquecido uma caixa de presentes. A caixa envolta em um papel  de uma beleza nunca vista antes por ele, um laço de fita dourada finalizava o lindo embrulho... Ele olhou para todos os lados, certificando-se de que ninguém o olhava, pegou a caixa e a colocou  sobre suas pernas. Lembrou-se do horóscopo e sorriu, pensando que sua sorte começara a dar as caras naquele dia.
O ônibus enfim chegou, ele entrou e sentou-se no banco próximo ao corredor com a caixa de presentes cuidadosamente instalada sobre suas pernas. Minutos depois, olhando três bancos a sua frente, viu uma loura linda; lembrou-se da alma gêmea e por esta razão sentiu seu coração disparar e seus olhos não conseguiram se desgrudar mais daquela mulher. Ela de vez enquanto o olhava e depois voltava-se para a janela onde sentava-se um senhor... O senhor deu uma virada para trás o encarando... Ele riu um risinho agradável, pensando ser aquele senhor o pai da tal loura. A loura olhava novamente, ele sorria faceiro e fazia trejeitos querendo conquistá-la... 
Chegando finalmente ao ponto onde deveria descer, deu sinal para que o motorista parasse o ônibus, encaminhou-se até a porta e antes de saltar deu uma piscadinha radiante para a loura.
Assim que deu alguns passos, já na rua, ouviu alguém que o chamava. Olhando para trás, para sua surpresa, viu que se tratava do suposto pai e da sua desejada loura. Radiante, lembrando-se do lido no jornal, aproximou-se de ambos... Sem que tivesse tempo de dizer qualquer coisa, recebeu um soco no nariz do suposto pai da loura que ainda o xingou de FDP, dizendo que fosse fazer gracinha para a mulher de outro...
Ele passou um lenço no nariz, que sangrava e entrou num banheiro público para lavar e tentar disfarçar o machucado nariz...
Olhou o relógio, estava quase uma hora atrasado, mas lembrando-se do horóscopo, ainda conseguiu sorrir; o nariz finalmente parara de sangrar, embora começasse a inchar... Sentindo-se refeito retornou seu caminho até o prédio onde trabalhava; subiu as escadas tranquilamente carregando a caixa encontrada no ponto de ônibus acreditando no que lera no seu horóscopo...
Quando entrou no local onde trabalhava o chefe olhou o relógio, fez uma cara de desaprovação e pediu que o acompanhasse . Ao entrem na sala, o chefe fechou a porta, dando-lhe uma bronca daquelas. Ele sem graça, temendo por seu emprego, lembrou-se da caixa de presente. Não sabia o que havia dentro, mas pela maneira como estava lindamente ornada, imaginava que conter a mesma, algo de valor... E recordando que a filha do chefe fazia aniversário naquele dia, e por coincidência  a mesma trabalhava também ali, lembrou-se novamente do horóscopo lido e fez as devidas ligações :
SURPRESA : Ter encontrado a caixa; 
ALMA GÊMEA :  Dando o presente para a filha do chefe a conquistaria, o que certamente faria o chefe lhe dar uma promoção.
Assim pensando, rapidamente, pedindo desculpas ao chefe pelo atraso, alegando ter se lembrado do aniversário da sua filha, disse-lhe que havia passado em uma loja para comprar uma lembrancinha para a mesma; o chefe, não amolecendo a bronca, mas vendo tão delicada caixa de presente, abriu a porta para que ele fosse, então, iniciar seus trabalhos do dia.
A filha do chefe entrou no escritório, ele a olhou sorrindo. Ela não fez nem um sinal de contentamento e encaminhou-se a sala do pai. 
Passado alguns minutos o chefe berrou seu nome, chamando-o imediatamente a sua sala. Ele ficou imaginando que o conteúdo da caixa devia ter surpreendido pai e filha. Assim pensando, ainda recordando do lido, entrou na sala do chefe... Suas narinas sentiram um cheiro terrivelmente forte de algo podre, mas...
O chefe, enquanto a filha tapava o nariz, sem dar muitas explicações, apenas apontando a caixa aberta à sua frente o despediu por justa causa... Antes de dar tempo para lembrar-se do que lera no jornal sobre seu horóscopo, ele olhou para dentro da caixa que encontrara no ponto e dera a filha do chefe; viu enojado, já quase vomitando, que ali dentro, sob tão delicado embrulho e laçarote, havia sido colocado três ratos já em avançado estado de putrefação...
Ele se retirou mas sem se abater com o ocorrido pois  acreditava no que lera e dizia seu horóscopo; se o horóscopo dizia que iria ter um dia de sorte é porque certamente  teria o tal dia de sorte... E sorrindo, distraidamente, acabou por tropeçar num pedra indo dar com a testa no meio fio.. ...desmaiou...
Luiz Dutra - outubro/2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário